sábado, 22 de março de 2008

Renascer

O encanto fugiu, voou e acabou-se.

Não há o que fazer, nem mesmo ouvir um tango.

No amor o desencanto
equivale à morte. Ele expele,
afasta, finda, sepulta, crema.
Com a mesma força que o encanto
atrai, aproxima, entrelaça.


Por ora não há nada a fazer
senão ocupar-me da terrível tarefa
de retirar milhares de camadas de ti
que se fixaram em mim.
De tanto dormires sobre o meu peito,
a máscara do teu rosto ficou moldada
por sobre o meu coração.

Quando, novamente, o infortúnio atravessar
uma faca enferrujada na minha carne
não terei as tuas mãos para tirá-la
das minhas entranhas.Quando for lua cheia
não te terei ao lado, para aos berros anunciá-la a ti
como se estivesse a anunciar a descoberta
de um astro novo.

Inúteis as lágrimas. Dispensável pôr–me de joelhos.
Se alegre, se saltitante,
à tua frente, como um potro adolescente,
deixei de te encantar,
não seria com a espinha dobrada
e os olhos nevados de sal
que eu faria o teu coração
novamente bombear
carinho por mim.

Nada a fazer.
Excepto aprender, com a aurora
a Renascer.

Adalberto Monteiro

2 comentários:

Anónimo disse...

Cláudia,

Cada poema é um grama de sal de que necessita o oceano. E a poesia é imprescindível ao processo de humanização o homem. Processo que está longe de completar-se.

Assim, teu blog é uma boa nova.
É bonito, a música é linda e os autores e os textos são bons.
Foi uma generosidade tua incluir o meu poema "renascer" entre os textos daquele elenco de escritores que todos nós amamos.
Escrever poesia, sempre, com a persistência e a luminosidade do sol.
Tudo de bom,
Adalberto Monteiro

cláudia pinho disse...

A poesia é um modo de espreitar a verdade. Há outros. Cada um escolhe o seu. Ou não escolhe e é escolhido.
O "Renascer" é franco, tem sal, tem voz e eco.
Benvindo a este espaço!
Tudo de bom.